31 maio 2008

Rosana Lamosa, na íntegra

Começando a dar os primeiros passos para novos caminhos, leia a entrevista que realizei com a soprano Rosana Lamosa, pela primeira vez publicada na íntegra no site da Revista Concerto. Clique aqui e não deixe de ler até o finalzinho e se divertir com a nova seção "contraponto".

foto: Clive Barda

26 maio 2008

A música nos dez anos do VivaMúsica!

Anuário chega em sua décima edição realizando retrospectiva da cena clássica brasileira na última década.

Começou a circular neste mês de maio a décima edição do Anuário VivaMúsica!. Para quem ainda não o conhece, trata-se de uma publicação única no Brasil, que compila importantes informações para quem trabalha com música clássica. Como bem define seu slogan, a publicação é "o guia de negócios da música clássica do Brasil", característica que acabou por definir a circulação dirigida do anuário (no entanto, o grande público pode adquiri-lo neste link).

Publicado pela VivaMúsica! Edições (a mesma que edita o roteiro de concertos da Cidade Maravilhosa), o sucesso e a credibilidade do anuário são produtos do empenho de Heloisa Fischer , Luiz Alfredo Moraes e equipe, que há anos têm a questão da sustentabilidade da música clássica brasileira como meta profissional. A partir deste ano eles passam a contar com uma ajuda extra, com a criação do Instituto VivaMúsica!.

Mas paralelamente às informações do guia, a edição aproveita seus dez anos para fazer uma retrospectiva desta última década, tão especial para a história da música clássica brasileira. Para isto, dez músicos e dez críticos/jornalistas foram convidados a darem seu depoimento.

Aos artistas, é claro, foi concedido o merecido espaço para contarem o que ocorreu em suas carreiras neste período e como eles vêm as mudanças pelas quais a cena clássica brasileira passou desde então. Constam o depoimento de Alex Klein, Antonio Meneses, Edino Krieger, Fernando Portari, Isaac Karabtchevsky, John Neschling, Leandro Carvalho, Luiz Fernando Malheiro, Nelson Freire e Roberto Minczuk (as entrevistas que deram origem aos textos impressos podem ser lidas na íntegra a partir deste link).

Já aos críticos/jornalistas foi perguntando qual foi o fato mais relevante da década e quais as três inciativas mais relevantes (o guia, por sua vez, elegeu um total de dez iniciativas).

Como fato, não deu outra: foi Osesp na cabeça! Tamanha unanimidade fez com que o anuário realizasse uma entrevista com Henry Fogel (atual presidente da Liga das Orquestras Americanas) para comentar o "fenômeno Osesp". Mas outro fato foi lembrado pela grande maioria dos homens de imprensa: o Festival Amazonas de Ópera.

Abaixo, publico na íntegra o depoimento que prestei ao anuário sobre o fato e as três iniciativas da década. Leia, pense, reflita e dê também a sua opinião, postando um comentário sobre este artigo. E viva a música!

Fato mais relevante da década no cenário clássico brasileiro.

Nos últimos anos o Brasil tem vivenciado uma série de transformações em seu cotidiano musical, que se tornou mais intenso, atrativo e com um grau de qualidade técnica provavelmente sem precedentes em nossa história. Estas transformações ocorreram em grande parte pelas mudanças que as orquestras sinfônicas do país têm passado nos últimos tempos (em especial, a OSESP, OSB e OPPM). Epicentros da vida musical de uma cidade, a melhoria de nossas orquestras mostra-se fator decisivo para a melhoria da música brasileira como um todo, à qual soma-se a crescente profissionalização dos serviços de produção musical, à parte o descaso que a música ainda sofre em diversas esferas do poder público.

Três iniciativas relevantes.

1. Osesp e a Sala São Paulo: em nossa história, poucas vezes observou-se o poder público tão empenhado em realizar um projeto musical desta envergadura.

2. Festival Amazonas de Ópera: se ópera na floresta era entendido como um delírio fitzcarraldiano, o FAO mostrou ao mundo que cultura não pode ser encarada enquanto segmentação de classes sociais. Junto com sua floresta, o evento faz da Amazônia um lugar ainda interessante (e obrigatório) de se conhecer.

3. Festival Música Nova: apesar de ativo há décadas, é importante ressaltar a persistência e o estoicismo de seus organizadores. Fazer nova música é essencial para a manutenção de nossa cultura, e o Brasil ainda está por calcular a dívida que tem para com este evento, que ainda carece do apoio institucional devido.

11 maio 2008

A música entre trevas e símbolos

Tão densa quanto curta, a ópera "O Castelo do Barba Azul", de Bartók, ganha fluída montagem no Municipal paulistano

Se uma das características mais marcantes da música ocidental do século XX é a pluralização de sua linguagem, não deixa de ser coerente pensarmos que este mesmo processo também ocorreu no universo da ópera. Sim, esta pluralização/fragmentação de fato sucedeu nos mais diferentes níveis lingüísticos da ópera, apesar de não ser tarefa das mais simples poder constatá-la na prática (afinal, se a própria música moderna ocupa um exíguo espaço no repertório contemporâneo, o que dizer da ópera moderna?).

Por isto trata-se de uma momento tão especial poder testemunhar a montagem de uma ópera como "O Castelo do Barba Azul", de Béla Bartók (1881-1945). Não bastasse o valor da obra em si, a montagem que foi levada ao palco do Theatro Municipal de São Paulo (montada pela primeira vez em 2006 no Palácio das Artes, em Belo Horizonte) detém o mérito de tornar esta que é uma ópera musical e dramaticamente densa num espetáculo belo e fluído.

Sob a direção cênica de Felipe Hirsch (leia entrevista abaixo), a história do "Barba Azul" teve seus aspectos simbólicos ressaltados por meio do habilidoso contraponto traçado entre os cenários de Daniela Thomas, a iluminação de Beto Bruel e a projeção de imagens de Henrique Martins. Simples e econômicos, o conjunto resultou num discurso visual atraente, baseado no contraste entre reflexos, trevas e feixes de luz.

Apesar de bela e fundamental, a parte cênico-visual do espetáculo foi a responsável pelo único, mas muito problemático, "porém" desta montagem: devido ao fato do cenário estar disposto longe do proscênio*, a performance do baixo-barítono Stephen Bronk (Duque Barba-Azul) e da soprano Céline Imbert (Judite) foi necessariamente prejudicada. Por muitas vezes ficou difícil ouvi-los, e isto deve-se ao fato do centro do palco do Municipal não se tratar do lugar apropriado para emissão de vozes solistas (ainda mais com uma orquestra bartokiana no fosso).

Veteranos de longa experiência, a quem não poucos adjetivos são merecidamente endereçados, o problema do posicionamento cênico não foi suficiente para impedir a bela interpretação que Céline e Stephen.

Foi também notável a desenvoltura com a qual a Orquestra Sinfônica Municipal enveredou pela complexa partitura de Bartók. Sob a precisa regência do jovem Rodrigo de Carvalho, o grupo soube trabalhar as diversas matizes da escrita bartokiana, mostrando-se uma orquestra muito diferente daquela que reestreou o "Falstaff" no início do mês passado.

Com a casa cheia e uma ótima recepção do público ao final da récita, espera-se que o maior feito do "Barba Azul" brasileiro seja mostrar que há demanda e espaço para um outro tipo repertório operístico. Afinal, sem renovação, como então exigir a manutenção e o respeito à tradição?

* proscênio: parte dianteira do palco
Foto: Carol Sachs

04 maio 2008

Entrevista: Felipe Hirsch

Figura das mais respeitadas do moderno teatro brasileiro, em 2006 o diretor Felipe Hirsch realizou sua estréia no mundo da ópera com o fundamental “O castelo do Barba Azul”, do compositor húngaro Béla Bartók (1881-1945). Neste mês de maio o público paulistano terá a oportunidade de conferir o trabalho operístico de Hirsch na segunda montagem da temporada lírica do Theatro Municipal. Foi sobre ópera, teatro e interessantíssimos desejos para o futuro que Hirsch falou com o OutraMúsica.

Antes de sua experiência com “O castelo do Barba Azul”, que tipo de relação tinha com a ópera?

Minha relação com a música em geral sempre foi muito intensa. Apesar de até o “Barba Azul” não ter me dedicado profissionalmente a ópera, sempre me interessei por ela. Anteriormente, já tinha recebido convites para dirigir ópera, mas não aceitei por achar que não teria tempo para fazê-las.

E o que então o levou aceitar a dirigir o “Barba Azul”?

No caso desta ópera de Bartók decidi topar porque gostava muito da história em si, pois ela tem um caráter simbolista que me agrada muito. Além disto, na época em que recebi o convite vi que ela se relacionava bastante com a peça de teatro que estava trabalhando, “A educação sentimental do vampiro”. Dirigir o “Barba Azul” foi uma experiência muito importante, e a considero entre os cinco melhores de Sutil [companhia de teatro dirigida por Hirsch].

Quais as diferenças mais significativas que vivenciou na direção de ópera em relação à sua experiência no teatro?

As diferenças são muitas, mas acho que soube equilibrar as informações e hábitos destes diferentes universos e realizar uma montagem bem “responsável”. Na parte musical fui estudar a obra de Bartók, tendo inclusive estudado com um professor húngaro, além, é claro, de estreitar ainda mais o relacionamento e a conversa musical com os cantores Stephen Bronk e Céline Imbert, bem como com Aylton Escobar, que fez a direção musical na estréia da montagem, em Belo Horizonte.

Mas, por outro lado, fiz questão de também ser “irresponsável” ao lançar sobre a ópera o olhar de alguém de fora deste mundo. Trouxe toda minha companhia para fazer o “Barba Azul”, e toda nossa experiência em teatro foi empregada no exercício da ópera, que nem sempre se orienta pelos mesmos valores do teatro moderno.

Como foi o processo de concepção da montagem do “Barba Azul”?

A gente desenvolveu o seguinte conceito para definir toda a história: o castelo do Barba Azul é o próprio Barba Azul. Na verdade, é ele quem abre as portas. Luzes e portas são símbolos de auto-conhecimento e de amor. Mas há também as portas sombrias, como a da vaidade e a da raiva. Foi a partir disto que vimos no castelo um meio de explorar este homem internamente. Assim, procuramos realçar o simbolismo presente na história, ao usarmos objetos como o espelho, o raio-x e o modo bastante holográfico com o qual usamos a projeção de imagens.

Quais as “vantagens” e as “desvantagens” que vê na direção de ópera?

Vantagem é a música. Pronto! A música é uma arte quase sem mediação, pois ela toca direto no emocional. Esta capacidade de diminuir o tempo entre o contato e a emoção é uma grande vantagem. Sobre as desvantagens, na verdade, estou tentando desmontá-las, mais especificamente alguns velhos hábitos presentes nas montagens tradicionais de ópera.

Como foi trabalhar a dramaturgia com o elenco vocal?

Na verdade, creio que tive muita sorte, pois o Stephan e a Céline são, além de grandes cantores, excelentes atores. Sei que isto é um privilégio que não sei se terei em outras experiências no gênero.

Em sua opinião, o que o teatro contemporâneo poderia assimilar da linguagem operística?

Acho que é a capacidade de pensar musicalmente e uma nova maneira de lidar com o tempo. E acho que não é só da linguagem operística que o teatro tem o que assimilar. Cada vez mais acho que o teatro é capaz de absorver tudo, e que ele é muito maior do que está sendo feito por aí. Precisamos fazer jus a esta capacidade do teatro de tudo absorver.

E se pudesse escolher seu próximo projeto em ópera, qual obra gostaria de dirigir?

Tenho uma atração pela música da II Escola de Viena. Logo, se pudesse, eu certamente escolheria o “Wozzeck”, de Alban Berg.

Serviço:

O Castelo do Barba-Azul, de Béla Bartók
Direção cênica : Felipe Hirsch
Direção musical: Rodrigo de Carvalho
Cenários e figurinos: Daniela Thomas
Elenco: Céline Imbert (meio-soprano), Stephen Bronk (baixo-barítono) e Guilherme Weber (ator, para o prólogo).
Orquestra Sinfônica Municipal de São Paulo.
Theatro Municipal de São Paulo, dia 11 de maio (17h) e 13, 15 e 17 (20h30). Ingressos entre R$ 20 e R$ 40.